O Lo-fi (ou Lo-fi Hip-Hop, como é popularmente conhecido) é um gênero de produção musical que surgiu recentemente quase como uma necessidade social em meio a este cenário caótico no qual estamos inseridos, uma válvula de escape da ansiedade e do cansaço gerado pela rotina desgastante, ou seja, uma forma de se desligar do mundo.
Seu nome é derivado de low fidelity (baixa fidelidade, em tradução oficial) denominação que faz jus às suas produções caseiras propositalmente inacabadas, assemelhando-se muito à proposta do rap undergroud dos anos 2000, no qual grupos como Quinto Andar e Subsolo fizeram nome.
“O aparecimento de inúmeros problemas que as pessoas simplesmente não sabiam que tinham, como a depressão, solidão e a insônia; incentivou-as a procurarem algo diferente pra preencher um ‘buraco’ e muitos encontraram isso no Lo-fi.”, afirma o DJ Rodrigo Lagoa (importante nome para a cena do Lo-fi brasileiro, o produtor de origem goiana, já performou ao lado de grandes nomes do rap brasileiro como MC Marechal, Nocivo Shomon, Rapadura, entre outros. Hoje, o DJ integra o grupo Faroeste e o duo UsDois).
Embora o gênero seja repleto de batidas leves e lentas, com a proposta de induzir o ouvinte a um estado de transposição psíquica — com ruídos de ambiente como barulhos de chuva, sons de cidade ou até mesmo o canto de pássaros — boa parte do público utiliza dessas características para a sua própria produtividade, como a escrita, a leitura, trabalhos de faculdade e atividades laborais.
“Falando de uma forma mais pessoal, no meu trabalho eu procuro trazer para os ouvintes um momento de reflexão, fazer com que a cabeça voe, se desligue de todos os problemas. Foi assim que surgiu o meu EP ‘Thinking About The Heifer’s Death’, ou num bom português ‘Pensando Na Morte da Bezerra”, conta DJ Lagoa.
Composto por 5 tracks, o EP “Thinking About The Heifer’s Death”, como Lagoa mesmo descreve, possui fortes influências de jazz: “Utilizei o saxofone como instrumento principal. É o elemento que dá sequencia a história, com influências de Coltrane e Parker, que se misturam harmonicamente com baterias leves e marcantes. Referencias que vão do jazz ao hip-hop”, afirma.
A relação do Lo-fi com o sample

Muitas das produções também são compostas por samples (pequenos trechos de músicas), que se mesclam de forma harmoniosa com os elementos já existentes. Esse foi um dos fatores com o qual o Lo-fi pôde ganhar destaque, e foi o que o deu visibilidade ao cenário brasileiro com os remixes de MPB.
Segundo o DJ Lagoa, após o fenômeno do Youtube — com playlists de Lo-fi tocando ao vivo 24 horas por dia e produtores “gringos” remixando grandes canções brasileiras de Tim Maia, Cazuza e Belchior — o Lo-fi também se fez presente nos serviços de streaming como no Spotify, onde as pessoas procuravam playlists com temáticas especificas: remixes de MPB, Lo-fi com batidas orientais ou aquelas nas quais os elementos do rap estão mais presentes.
“O que determina o Lo-fi na realidade é a forma com que ele é construído, não é simplesmente o barulho do disco arranhando e as batidas leves. Existe também Lo-fi cantados, com batidas parecidas com o da House Music, que procura levar um outro tipo de sentimento e emoção, talvez até algo mais alegre.”, esclarece DJ Lagoa.
No entanto, há um grande percalço nisso tudo, como já mencionamos na matéria “A Importância do sample e do vinil para a cultura hip-hop”, os produtores brasileiros sofrem demais com os direitos autorais das músicas originais, o que dificulta bastante a divulgação e a regulamentação do trabalho.
Para que um som entre no Spotify, por exemplo, DJ Lagoa nos responde: “É bom deixar bem claro que, se você não tem a autorização para utilizar aquele sample, se ele não é de uma música que virou ‘domínio público’, você pode ter problemas com essa utilização de forma irregular, e é por isso que você encontra no Youtube inúmeras versões, mas não encontram essas versões no Spotify, pois a plataforma não aprova música se não tiver tudo documentado, autorizado.”, até porque “grandes produtores de Lo-fi praticamente só usam samples, e eu não vejo demérito algum nisso.”, diz.
Um exemplo bastante conhecido na cena do rap foi é a música Oração à Vitória do rapper Baco Exu do Blues. A música tem como sample a canção Francisco do Milton Nascimento e foi retirada do Spotify pouco tempo após o rapper lançar seu álbum Esú na plataforma.
A presença do Lo-fi no Rap
O Lo-fi só tende a crescer e perdurar em nossos momentos de descanso e concentração. O ritmo já cresceu tanto, que já se faz presente até nas produções de Rap. Segue abaixo alguns exemplos de músicas que fazem o uso do gênero:
Lessa Gustavo

Foto: Nico Fernandes.
Makalister

Foto: Divulgação.
· O Tempo nos Parece Mais Pesado que O Físico
· Ponga, Espanha — Fita perdida 2016
Yung Vegan

Foto compõe a capa do EP Babaganoush.