A MostraSP, por meio de sua diretora desde 2011, Renata de Almeida, vem consolidando este evento como um espaço de democratização do cinema, em que concilia iniciativas independentes, investimentos e parcerias, tanto dos setores públicos quanto privados, para reafirmar a vocação de um lugar de debate, expansão territorial de telas para além do circuito comercial, mais visibilidade para o cinema nacional e ainda ser um ambiente de resistência cultural.
A abertura da Mostra para a possibilidade de existência desse prêmio, dentro de um evento que já está consolidado no calendário do audiovisual brasileiro, e sendo uma iniciativa independente que celebra não apenas narrativas do Brasil, mas do mundo todo, tenciona e reposiciona o cinema de gênero dentro do ecossistema do audiovisual, mostrando que é mais necessário do que nunca representar as multiplicidades de vivências queer dentro das grandes telas do cinema.

Um dos principais festivais de cinema do mundo, o de Berlim, é um exemplo de que iniciativas como esta valorizam eventos de grande porte, que, para além de cinefilia, também se constituem como um ato político e de insurgência contra discursos conservadores de nosso tempo. O Teddy Award, que é entregue desde 1987 dentro da premiação do Festival de Berlim e hoje é considerado um dos maiores prêmios do mundo com essa temática LGBTQIA+, premiou, por exemplo, em 2018, o filme nacional “Tinta Bruta“, de Marcio Reolon e Filipe Matzembacher, e este ano estavam presentes na Mostra com o filme “Ato Noturno“.
Assim, o Prisma Queer nasce como ato político e estético, evidenciando que a imagem — quando refratada pela multiplicidade de vivências dissidentes — ilumina fissuras, memórias, levando à esperança de imaginar futuros possíveis. Seu símbolo, o prisma que desdobra a luz em diversas cores, sintetiza a proposta do prêmio: o júri selecionado quer tornar visível o que historicamente foi silenciado, distorcido ou relegado às margens, mesmo que mais recentemente filmes com essas temáticas tenham chegado aos cinemas, sabemos o quanto o grande público tem resistência em consumir essas narrativas, então iniciativas como esta coloca em evidência que estes filmes existem e que tem relevância, histórica, social e técnica.
Antes dos prêmios, foi anunciada a primeira homenageada do Prisma Queer, Rita Moreira, jornalista, ativista e diretora de importantes documentários no período de transição entre a ditadura e a democratização. Ela precisou se exilar do Brasil nos anos 70 e foi para os Estados Unidos da América. Lá, teve contato com os movimentos feministas e de contracultura e, na volta ao Brasil nos anos 80, se estabeleceu como uma das principais vozes que denuncia o genocídio da população LGBTQIA+. Ao fazer essa homenagem, o prêmio estabelece um elo crucial entre memória e presente. Reconhecer Rita é reconhecer que o cinema queer brasileiro nunca nasceu no conforto — mas na urgência, na ferida social, no desejo de existir e resistir diante da violência estrutural.
O júri do prêmio que este ano foi composto por nomes como: Pedro Henrique França, diretor e ator premiado; Chica Andrade, cineasta e atriz do programa Sundance Trans Possibilities; Viviane Ferreira, diretora e ex-presidente da Spcine; Julieta Paredes, cineasta e ativista indígena feminista; Joseph Adesunloye, diretor queer nigeriano-britânico; Alice Chiappetta, produtora e diretora, e atualmente sócia da Bahaez; e Lucas Weglinski, cineasta premiado no Mix Brasil e homenageado no Queer Porto, evidencia uma perspectiva transnacional, interseccional e política e que não se propõe apenas a ser um painel representativo, mas sim mostrar um coletivo que articula experiências de dissidências, raças, territórios e gêneros como forma de pensamento crítico na sétima arte.
“A Natureza das Coisas Invisíveis“, de Rafaela Camelo, exibido no Frameline, um dos mais antigos festivais de cinema dedicado à cultura LGBT do mundo e que acontece em São Francisco, nos EUA, onde ganhou o prêmio de melhor filme de estreia, sai dessa 49ª Mostra com um grande destaque. Com o prêmio de melhor filme nacional com temática queer e prêmio da crítica de melhor filme nacional da Mostra, a obra, que será distribuída no Brasil pela Vitrine Filmes, deve chegar aos cinemas brasileiros em 27 de novembro de 2025. Fazendo parte do projeto Sessão Vitrine Petrobrás, a obra captura de forma delicada e densa as camadas do desejo, da perda e do silêncio, revelando o íntimo como campo político, em que o invisível não é ausência, mas matéria viva.
Além do prêmio e homenagem, destacamos também a edição do Prisma Queer Network, iniciativa que ocorreu dentro do V Encontro de Ideias Audiovisuais, evento este concomitante à MostraSP, que teve como diretoras e organizadoras a própria Renata de Almeida — também responsável pela Mostra — e Cristiane Passafaro Guzzi, além de contar com a produção executiva de Leila Bourdoukan, se mostrou como um amplo espaço de debate em que diversas iniciativas, tanto de setores públicos como privados, puderam mostrar de que forma visam promover e propor projetos para o futuro do ecossistema do audiovisual brasileiro.
O Prisma Queer Network, por meio de várias parcerias, selecionou 20 ideias que estão em fase de desenvolvimento ou finalização, em que puderam participar diversos artistas da comunidade LGBTQIA+ para se conectar com diversos agentes do setor por meio de um pitching. Entre essas ideias, tiveram alguns projetos que ganharam prêmios para o desenvolvimento final e que você pode acompanhar pelas redes sociais do prêmio.
Esperamos que premiações como esta, espaços que a MostraSP proporcionou e que o V Encontro de Ideias abriu as portas para que pudesse acontecer fortaleçam cada vez mais o cinema LGBTQIA+.
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