Cinema

Entrevista com Alfredo Manevy, diretor de “Lupicínio Rodrigues: Confissões de um Sofredor”

O documentário “Lupicínio Rodrigues: Confissões de um Sofredor”, estreia de Alfredo Manevy na direção, conta a história de Lupicínio Rodrigues – um dos maiores nomes da história da música brasileira. Nascido em 1914 em Porto Alegre, ele é considerado o pai da sofrência. O artista e a plenitude de sua obra são homenageados em forma de um longa-metragem lançado em 2024. Assista ao trailer aqui.

O longa conta com comentários, entrevistas, áudios e imagens de arquivo com registros de nomes consagrados da música popular brasileira como Cazuza, Caetano Veloso, Gal Costa, Elza Soares, João Gilberto e Gilberto Gil (este último concedeu uma entrevista exclusiva ao documentário). Outro entrevistado importantíssimo que merece destaque é Zuza Homem de Mello, jornalista e grande pesquisador da música brasileira, que faleceu em 2020. Todos esses gigantes reverenciam Lupicínio Rodrigues e suas composições. O samba brasileiro não seria o mesmo sem a influência gigantesca de Lupicínio. Além do samba carioca, a música de Lupicínio também dialoga com o tango argentino. A bossa nova também deve muito a Lupicínio, segundo o próprio.

“Lupicínio Rodrigues: Confissões de um Sofredor” utiliza entrevistas realizadas por Lupi entre 1968 e 1974, ano de sua morte. A voz de Lupicínio, seja na forma de música ou de uma entrevista, está presente na maior parte da obra e isso faz o espectador se sentir mais próximo de sua figura. Fotos históricas do Lupicínio e sua família são mostradas, além de retratos de regiões do Brasil que Lupi percorreu em seu tempo, lugares como Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro e São Paulo.

O trabalho, que tem pouco menos de 1h40 de duração, estreou oficialmente nos cinemas brasileiros no dia 14 de março. A Pista conversou com Alfredo Manevy, o diretor do trabalho, sobre Lupicínio, sua admiração pela música brasileira, os desafios do cinema nacional e suas influências durante a realização do documentário – filmes, curtas e séries. Leia abaixo.

Entrevista com Alfredo Manevy

A Pista: “Lupicínio Rodrigues: Confissões de um Sofredor” foi seu primeiro trabalho como diretor. Como foi a sua experiência ao fazer esse documentário sobre uma figura tão importante da história da música brasileira? Quais foram suas principais dificuldades neste processo?


Alfredo Manevy: Foi um privilégio conviver com o universo de Lupicínio por cinco anos. A música brasileira é uma das contribuições mais ricas do país ao mundo e suscita muitas questões sobre o que somos como sociedade, como lidamos com nossa memória musical que tanto moldou nossa forma de ser. A gente encontra todas as respostas na música brasileira, diz Jards Macalé no filme e acho que ele aponta para essa dimensão de que a música brasileira é uma chave que abre muitas portas. Foi um incrível desafio encontrar  imagens e falas inéditas de Lupi, por exemplo, e fugir de um estereótipo já sedimentado e dos folclores que rondavam o personagem. Mas a cada nova descoberta, foi ficando claro que tínhamos um personagem fascinante, um filme possível, que poderia trazer à tona o olhar único de Lupicínio sobre as coisas do Brasil.

A Pista: Qual era a sua relação pessoal com a música de Lupicínio Rodrigues antes da produção do documentário?


Alfredo Manevy: Minha primeira paixão foi “Esses Moços”, cantada por Gil, porque era uma emoção forte escutar seguidas vezes essa música. A letra eu demorei pra entender todo o sentido, e quando consegui entender um pouco do humor do compositor. Para mim, Lupicínio era um dos enigmas da música popular brasileira. Como um sambista, autor de tantos clássicos e sucessos que nos tocam a alma, conseguiu construir sua carreira em Porto Alegre, fora do epicentro da indústria cultural? Lupi era um mistério imenso. E de certa forma segue sendo um enigma.

Alfredo Manevy, o diretor de "Lupicínio Rodrigues: Confissões de um Sofredor" (Foto: Divulgação)
Alfredo Manevy, o diretor de “Lupicínio Rodrigues: Confissões de um Sofredor” (Foto: Divulgação)

A Pista: Você tem uma música favorita do Lupicínio? Se sim, qual e por quê?

Alfredo Manevy: Umas das músicas que prefiro é “Quem há de dizer”, que João Gilberto gravou. É um verdadeiro filme, que se passa num bar, narrado por alguém que aconselha um amigo a lidar com um sofrimento de amor. Essa música é de Lupi com Alcides Gonçalves, um dos seus colaboradores mais importantes. Na voz de João Gilberto, a gente percebe que essa música é puro cinema.


A Pista: Cenas do filme “Rio, Zona Norte” de Nelson Pereira dos Santos são mostradas durante o seu documentário. O enredo deste clássico do cinema brasileiro lembra um pouco a história de Lupicínio. Os cineastas brasileiros carregam essa responsabilidade imensa de retratar a cultura do nosso país desde sempre. Como você enxerga o estado atual do cinema brasileiro?


Alfredo Manevy: É um momento bom, em que temos tudo para dar um salto. Há reconhecimento internacional da nossa produção, mas precisamos conquistar nosso público aqui dentro no Brasil. Nossas políticas públicas precisam investir na melhoria dos roteiros, na distribuição e na ampliação do parque exibidor. Uma política industrial para o cinema é necessária porque é uma atividade complexa, geopolítica, em que nenhum país participa e é bem sucedido sem uma estratégia de Estado.

A Pista: Além de “Rio, Zona Norte”, quais outros filmes você considera que serviram de inspiração para esse documentário sobre Lupicínio?

 
Alfredo Manevy: “Noel Rosa”, de Rogério Sganzerla. “Nelson Cavaquinho”, de Leon Hirszman. “Meu Cumpadre Zé Keti”, de Nelson Pereira dos Santos. “Garoto”, de Rafael Verissimo. São brilhantes filmes. Cito também a série “Jazz”, de Ken Burns, que faz um uso rico de foto na reconstrução de biografias. 

Siga A Pista em todas as redes sociais (InstagramX e Facebook) e não perca nenhuma dos nossos textos sobre cinema, literatura, séries e música!

Torne-se um apoiador da Pista no apoia.se clicando aqui. Você também pode apoiar o nosso trabalho e o jornalismo cultural independente com qualquer valor via Pix para apistajornal@gmail.com.

Leia também:

“Elis & Tom – Só Tinha de Ser com Você”: Documentário mostra os bastidores de uma bela união

Deixe uma resposta