Cinema

Sob o olhar de “Priscilla”, novo filme de Sofia Coppola

Em "Priscilla", vemos o outro lado da história sobre um dos maiores romances do século XX
Priscilla, de Sofia Coppola. (Foto: Divulgação)

Em cartaz nos cinemas brasileiros desde o dia 4 de janeiro, o novo longa de Sofia Coppola coloca em cheque a grandiosidade de um dos maiores nomes da música – Elvis Presley. Sob a perspectiva de Priscilla Presley (ou Priscilla Beaulieu, como ela nos é apresentada no início do filme), vemos o florescimento de um romance polêmico e midiático, enquanto temos uma visão privilegiada dos bastidores dessa união.

O filme tem como base a autobiografia escrita por Priscilla em coautoria com a autora Sandra Harmon chamada “Elvis e Eu“, que relata os detalhes e controvérsias da união entre ambos. Publicado em 1985, o livro virou uma minissérie homônima poucos anos depois, sendo esta a maior referência que os brasileiros tinham sobre essa história até então.

A Priscilla de Cailee Spaeny é uma figura doce, pura e inocente, algo pouco (ou nada) associado à Priscilla real quando a vemos na mídia. Porém, o que se costuma ignorar é que ela tinha apenas 14 anos quando conheceu Elvis, que tinha 24 anos na época. A “adultização” e sexualização dela foi algo construído e incentivado, predominando até hoje, se vemos obras como a cinebiografia de Elvis, dirigida por Baz Luhrmann e estrelada por Austin Butler.

Essa dicotomia entre ser uma menina ou ser uma mulher – ou ainda, a mulher de Elvis Presley – é uma das grandes questões da personagem. Priscilla ainda frequenta a escola, mas está envolta em fofocas e matérias baratas de revista sobre seu envolvimento com o cantor. Ainda por cima, precisa lidar com o fato de mulheres famosas, mais velhas que ela, aparecerem constantemente como affair de Elvis. Tal atmosfera de competição e visibilidade extrema vai envenenando aos poucos a personalidade de Priscilla e seu relacionamento, causando uma série de conflitos internos e externos.

O cantor vai aos poucos ocupando espaços na vida de Priscilla até não restar praticamente nada sobre ela. Não vamos nos esquecer que Elvis Presley era um homem típico de seu tempo. Cantava sobre amor e encantava mulheres de todo o mundo, mas apresentava comportamentos misóginos, machistas e violentos nos bastidores. Quanto ao estilo do personagem, interpretado por Jacob Elordi, ele traz um quê de caricatura. É uma figura um pouco fora do real, como se fosse apenas uma ideia do que é o Elvis, e não uma representação de fato.

Além disso, a grande diferença de idade entre ambos, além da diferença de altura, transformam o Elvis de Jacob Elordi também em uma grande figura opressiva. A diretora Sofia Coppola tem uma tendência em acentuar essas diferenças, de forma a subverter a ideia que tínhamos desse relacionamento até então. Priscilla vai aos poucos se esvaziando, enquanto implora por mais de Elvis: mais presença, mais afeto, mais respeito.

Por outro lado, Elvis está mais interessado na imagem de Priscilla do que de fato com ela mesma. Ele ama exibi-la para seus colegas, ama que falem deles, mas tudo sob controle dele próprio. Em suas mãos, a menina vira uma boneca, a qual ele pode vestir, maquiar e moldar a seu bel prazer. E quando ela faz o que quer e veste o que quer, é repreendida e zombada. Assim, chegamos finalmente à imagem que conhecemos dela: cabelos pretos, topete alto, olhos pintados de preto – tudo uma ilusão, uma criação artificial.

É inegável que Priscilla colha os frutos dessa união até hoje (inclusive carregando o sobrenome Presley, mesmo com o divórcio em 1973), mas é igualmente necessário que reconheçamos a influência negativa do cantor na vida dela. Elvis era um astro, mas todo astro tem uma órbita devoradora ao redor dele.

E é assim que um filme sobre Priscilla Beaulieu acaba, por vezes, virando um filme sobre Priscilla Presley. Não espere uma cinebiografia tradicional, mas também não espere que o filme seja um pretexto para falar mais sobre Elvis. Nisso, Sofia Coppola foi cirúrgica: a forma como o filme acaba mostra exatamente a que veio, só assistindo para saber!

O filme é distribuído nos Estados Unidos pela A24 e chega ao Brasil distribuído pela MUBI e a O2 Play.

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